quinta-feira, 23 de setembro de 2010

CAIXA VAZIA

HÁ TEMPOS ESTOU SEM ESCREVER.

AS TENTATIVAS DE PÔR ALGUMAS PALAVRAS NO PAPEL SÓ NÃO FORAM MAIORES QUE AS DE SUICÍDIO.

TENTO PÔR AS PALAVRAS NO PAPEL, MAS ME SUJO DO SANGUE QUE SAI DOS MEUS PULSOS.

VOU ATÉ A COZINHA.

DESVIANDO DAS CAIXAS VAZIAS.

AS CAIXAS VAZIAS DOMINARAM A MINHA CASA.

AS CAIXAS VAZIAS ESPALHADAS PELA CASA DENUNCIAM A PALAVRA “MUDANÇA”.

EU SOU UMA CAIXA VAZIA.

LIMPO O SANGUE DOS MEUS PULSOS COM PAPEL TOALHA.

GOSTO DE VER O PAPEL TOALHA ABSORVENDO O SANGUE.

PARO DE SANGRAR.

TENTO NOVAMENTE PÔR AS PALAVRAS NO PAPEL, MAS NÃO ME CONCENTRO.

DEVE SER PELA QUANTIDADE DE TRAMAL E MORFINA QUE INGERI HÁ MEIA HORA.

EU SOU UMA CAIXA VAZIA.

ME SINTO ZONZO.

COMO SE NÃO ESTIVESSE AQUI.

DOU UM TEMPO.

VOU AO BANHEIRO E ENFIO O DEDO NA GARGANTA.

OS LABORATÓRIOS “CRISTÁLIA” AGRADECEM A PREFERÊNCIA.

VOLTE SEMPRE.

ME SINTO UM POUCO MELHOR.

TENTO PÔR AS PALAVRAS NO PAPEL, MAS O CANO DO 38 CINTILA SOBRE A MESA.

ELE ME CHAMA:

- MAIS UMA VEZ, SÓ MAIS UMA VEZ.

EU SOU UMA CAIXA VAZIA.

NÃO RESISTO.

PONHO A BALA.

GIRO O TAMBOR.

PUXO O GATILHO.

CLIC.

TRÊS A ZERO PRA MIM.

DEIXO O 38 DE LADO.

TENTO PÔR AS PALAVRAS NO PAPEL...

OUÇO OS BARULHOS DOS CARROS.

OLHO PARA O FIO ELÉTRICO QUE SAI DO CHUVEIRO.

A DISTÂNCIA DA JANELA DO MEU QUARTO ATÉ A CALÇADA.

A RESISTÊNCIA DO VARAL DE PENDURAR ROUPAS.

EU SOU UMA CAIXA VAZIA.

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